Foi quando percebeu um homem com traje típico paquistanês se aproximar da porta da igreja. Por suas roupas, o pastor deduziu tratar-se de alguém de uma tribo do norte, onde as tropas do governo se digladiavam diariamente com extremistas islâmicos instigados pelos talibãs do outro lado da fronteira.
Incomodado com o sino da igreja que tocava para anunciar a hora, o homem cuspiu no chão e começou a amaldiçoar. “O Paquistão enfrentará o fogo do julgamento por permitir que esses kafir (infiéis) construam suas igrejas de blasfêmia!”, ele bradou em alta voz para que os pedestres pudessem ouvir.
O pastor concentrou sua atenção na porta da igreja, onde uma tropa de 12 policiais armados montava guarda 24 horas por dia. Em resposta a um alerta que correu na cidade inteira, avisando que as igrejas da cidade seriam atacadas, o governo enviou uma segurança adicional para proteger a igreja deste pastor das ameaças de um bombardeio ou de alguma agressão armada.
Ele balançou a cabeça se lembrando de como seu ânimo desfalecera, há algumas semanas, quando sua filha de 12 anos lhe trouxe um bilhete de ameaça que encontrara no pátio da igreja quando voltava para casa. O bilhete anônimo era breve, mas incisivo em suas declarações: “Os cristãos apoiam o Ocidente. Eles são aliados de uma sociedade imoral e culpada. O islã nada tem a ver com eles. Todos os cristãos devem ou se converter ao islã e entregar suas igrejas para se tornarem mesquitas ou então deixar o Paquistão.”
“Somente pessoas autorizadas poderiam atravessar a guarda armada e entrar no terreno”, o pastor pensou sem conseguir disfarçar seus temores diante da esposa e das filhas. Aquele bilhete não poderia ter sido apenas “lançado por debaixo da porta”, como a polícia sugeriu quando ele deu queixa.
Ele preferiu ignorar o ofensor que blasfemava e retornar ao seu estudo bíblico, tentando trazer a concentração de volta para a preparação do sermão sobre Isaías 55, acoplado ao convite de Jesus para o evangelho: “Vinde a mim todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei”.
De volta à sua escrivaninha, ele lutou para praticar o que planejava pregar. “Como posso dizer ao meu povo que há descanso em Jesus quando eu mesmo estou lutando, hoje, para conseguir descansar nEle?”, ele falou em voz alta para se obrigar a admitir que sentia ansiedade e medo. "Há alguém em volta de nós que está envolvido de alguma forma com o extremismo?", ele ponderou. “Alguém que conseguiu romper a barreira policial para colocar esse bilhete no pátio, antes de minha filha atravessá-lo? Se eles conseguiram chegar até lá é sinal de que podem chegar mais perto a qualquer momento!”
As possibilidades eram muitas. Talvez houvesse um policial fanático entre os guardas da porta da igreja. Ou infiltrados na congregação. O pastor sentia com alguma frequência a presença perturbadora de gente suspeita entre os membros da congregação. Ou talvez fossem apenas agentes secretos da polícia escalados para “protegê-los”, na medida do possível, dos grupos hostis.
Ele não conseguia desvincular seu desconforto das lembranças que surgiam dos interrogatórios periódicos a que fora submetido pela polícia secreta. Eles tentaram bisbilhotar todas as áreas da atividade da igreja, fazendo perguntas em muitas direções para confundi-lo e fazê-lo tropeçar.
E como sempre, ele vivia com medo de que ele ou algum dos membros da congregação pudessem ser alvos de acusações forjadas de blasfêmia. Com certeza, qualquer cristão acusado de blasfêmia contra o islã, o alcorão, ou o profeta Maomé estaria indefeso diante da polícia e dos procedimentos judiciais: prisão imediata, espancamentos, e anos no cárcere. Só piorava as coisas os cristãos serem interpretados na mídia como intimamente ligados ao ocidente. “Esta é uma imagem falsa que o islã divulga, levando todos a acreditarem que nós somos estrangeiros imorais e traidores deste país. Nós somos paquistaneses, mas por sermos cristãos eles nos tratam como inimigos!”
O pastor não ousava contar aos cristãos que conhecia no ocidente a respeito de todas as perseguições que sua igreja enfrentava. Ele sabia bem que se os estrangeiros protestassem, pressionando seu governo para intervir, isto tornaria as coisas ainda piores para os crentes do lugar.
“Nós todos sabemos como eles odeiam cristãos neste país”, ele suspirou.
“Nós todos sabemos como eles odeiam cristãos neste país”, ele suspirou.
Quebrantado, ele caiu de joelhos, liberando sua tensão e seus medos. “Eu não posso continuar nesta missão, Senhor, a não ser que tenha gente orando por mim. Ensine-me e mostre-me como descansar em Ti, como lançar todo esse fardo sobre Ti, para que eu possa ajudar meu povo a fazer o mesmo.”
“E, por favor, não deixe que nossos irmãos e irmãs cristãos ao redor do mundo se esqueçam de nós – lembre-os hoje de orar por nós, lembre-os para nos ajudarem em nossas batalhas espirituais. Somente juntos nós podemos derrubar as fortalezas que o inimigo levanta contra nós.” Quando voltou a ficar de pé, o pastor lembrou-se que o apóstolo Paulo, certa vez, tinha perdido a esperança até da própria vida. E o que foi que lhe devolveu a esperança para prosseguir e não desistir?
Ele manuseou a Bíblia à procura do primeiro capítulo da Segunda Carta aos Coríntios. “Sim, aqui está – a resposta para mim e para toda a minha congregação!” Então, leu lentamente os versículos 10 e 11: “Ele nos livrou e continuará nos livrando de tal perigo de morte. Nele temos colocado a nossa esperança de que continuará a livrar-nos, enquanto vocês nos ajudam com as suas orações. Assim muitos darão graças por nossa causa, pelo favor a nós concedido em resposta às orações de muitos.”
“É assim que vou terminar meu sermão de amanhã!”, ele disse, finalmente descansando o coração. “Paulo também não podia dar conta sozinho. Ele sabia que ‘as orações de muitos’ era a chave. Essa é resposta de Deus para nós, nos manter confiantes para o que possa estar por vir!”
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