Fui sarada para sarar outros
Nasci em um lar cristão, por isso sempre foi comum para mim ouvir que Deus também é um Pai, mas somente com 22 anos de idade foi que eu entendi e recebi minha identidade como Filha.
Acredito que a coisa mais dolorosa que já ouvi da parte de Deus foi: "-Você não age como filha, você não sabe ser filha." Fiquei chocada com aquilo! Como assim eu não sei ser filha? E entre um turbilhão de pensamentos confusos, Deus começou a cuidar de mim e pouco a pouco eu comecei a concordar com o Senhor quando analisei diversas situações onde Ele não tinha espaço na minha vida... Eu não confiava que Ele poderia cuidar de mim e proteger em situações de risco, embora Ele sempre o fizesse eu continuava desconfiando.
Eu não conseguia vê-Lo como provedor, porque sempre fui muito independente e passar a depender Dele ainda é algo muito desafiador para mim. Eu não conseguia me sentir mimada e amada ou me sentir segura de que NUNCA seria abandonada. Descobri que muitas vezes minha obediência era por medo de afastá-Lo de mim, e por fim, descobri que não conseguia O chamar de Pai...Tudo sequelas da orfandade! Eu era parte Dele, mas não me sentia como. Não ter tido o amor do meu pai durante toda a minha vida, me fez ter dificuldades para me sentir amada, especialmente por Deus.
Começou o processo de cirurgia na alma e foi muito doloroso! Me descobrir, começar a acreditar e confiar Nele, aprender a ser filha. Lembro do dia que orei entregando meu coração dizendo que eu queria aprender a agir e ser Filha, e daí começou uma grande mudança na minha vida, como um treinamento. Pela primeira vez em toda minha vida, eu senti as várias facetas do Pai que cuida, que protege, que mima, ama incondicionalmente e NUNCA, nunca me deixa sozinha e não me abandonará jamais. Ainda lembro dos anos que fui órfã, mas não me dói mais; eu encontrei meu Lar e meu Pai, e hoje tenho um nome!
Fragilidade x Rebeldia= Eles só querem receber amor
Agora estou convivendo e cuidando de muitas crianças órfãs na Tailândia, e como tem sido desafiador! Tenho lembrado muito do Abrigo em Manaus(Brasil), e das crianças de lá. Algumas abertas para dar e receber carinho, outras nem um pouco. Lembro de um garoto que se aproximou de mim no meio do culto na base missionária, e ele não falava comigo, não me olhava, não me permitia sequer passar a mão em seu cabelo, apenas estava ao meu lado, e às vezes esbarrava em mim de propósito e com grosseria. Eu apenas fiquei lendo os sinais que ele me enviava, e na verdade ele queria amor e carinho, só não sabia como receber, e talvez o medo de ser rejeitado o fazia agir daquela maneira, mas no final eu ganhei um abraço rápido e meio bruto... São características próprias de órfãos: se apegar demais quase que implorando amor, necessitar de muita atenção, alguns agem de maneira mais ousada quando se permitem ser tocados, abusados, só pra se sentir desejados por alguém. Outros agem totalmente no extremo da rebeldia, não sabem ser submissos, amáveis, e assim como não sabem ser, não sabem receber amor também, mas na verdade é tudo medo de rejeição.
Aqui não é diferente, as crianças têm essas características também, e muitas vezes é muito contraditório, difícil de entender por que alguém que apenas deseja amar e se sentir amado não consegue...Mais uma vez lembro de mim, e de todas as vezes que eu errei por não saber como demonstrar amor. Lembrei do longo tempo que levei até deixar o meu coração ser completamente inundado pelo amor e paternidade de Deus, e assim como muitas pessoas usadas por Deus para me ajudar e investir tempo na minha vida com toda a paciência, tenho feito também, e por mais difícil que pareça ser lidar com órfãos, eu sei que das minhas feridas podem sair poder para curar aqueles que necessitam ter um encontro de Pai com filho.
Aqueles que mais tem dificuldades para amar, são os que mais precisam de amor! |